O
Papo Cabeça de hoje é mais do que especial. É uma homenagem a um ser humano
exemplar e um dos maiores expoentes do futebol paranaense de todos os tempos.
Um pequeno grande homem, que com a simplicidade dos gênios, a liderança dos
guerreiros e o encantamento dos imortais, transformou o ato de jogar bola em
uma coisa fácil e corriqueira... para ele. Ave, Mario da Rocha! Salve, craque Marinho.
Neste
Papo, a trajetória de vida e de bola do maior e mais importante jogador de
futebol da história do Paraná Clube. Alguns podem perguntar: “do Paraná Clube?”...
Respondo que sim, evidente que sim. Colorado e Pinheiros foram os geradores do
atual Paraná Clube, portanto, os atletas que jogaram nesses clubes fazem parte
dessa história. E Marinho vestiu com maestria as camisas de ambos. E ninguém o
fez melhor que ele. E nem os que posteriormente vestiram a camisa tricolor,
azul, vermelha e branca, do Paraná Clube o fizeram.
Marinho
chegou ao Colorado em 1974, quando o clube, que nasceu da fusão entre
Ferroviário, Britânia e Palestra Itália, em 1971, ainda não havia conquistado
nada. Já em 1974, um vice-campeonato. Que se repetiu em 75 e 76. Em 1980, o
único título de campeão do Colorado, dividido com o Cascavel. Em 1982 mais um
vice-campeonato, na final contra o Atlético/PR.
Depois
de algumas andanças fora do estado do Paraná, voltou e foi renegado pelo
Colorado, que preferiu os grandes astros do “Sele-Boca”, em 1984. Marinho então
partiu para o lado azul do Paraná Clube: transferiu-se para o Pinheiros. E
conduziu o “Leão da Vila Guaíra” ao título deste ano, justamente sobre o
Sele-Boca. Ficou no Pinheiros até 1989. Foram mais três vices, em 85, 86 e 88,
e o título de 1987.
Ou
seja, em tudo que Colorado e Pinheiros conquistaram, existe a marca de
competência e a liderança deste “baixinho”, que com os seus 1,68m de puro
talento, se transformava em um leão quando entrava nos gramados.
Ganhou
muitas vezes os prêmios individuais mais importantes na época (Troféu Corujinha
de Ouro, do Jornal Tribuna do Paraná e Troféu Chuteira de Ouro, do Jornal
Diário do Paraná). Oito vezes a Corujinha e seta a Chuteira. Por seis vezes foi
escolhido o craque do Ano do futebol paranaense.
Neste
Papo Cabeça, Marinho nos conta as “artes” do menino craque, pelos campinhos da
sua Vila Sofia; das passagens pelo juvenil do Britânia, pela Seleção Paranaense
de Juvenis, em 1970; da família; dos dias de Bamerindus e da chegada ao
Colorado; e... bem, é melhor deixar que ele mesmo nos conte...
Serginho
Prestes (SP): Onde e quando veio ao mundo o menino Mario da Rocha?
Marinho(
MR):
Nasci em 10/06/1951, na Vila Isabel, em um bairro chamado Tamoio.
SP:
Viveu lá até quando?
MR:
Até os sete anos. Depois nossa família veio para a Vila Sofia.
SP:
Fale um pouco da sua família. Seus pais. Quantos irmãos?
MR:
Meus pais se chamavam Aristides e Joaquina da Rocha. Éramos em 12 irmãos: sete
homens e cinco meninas. Meu pai
trabalhava numa marcenaria, aqui no bairro, perto do quartel do Boqueirão. Era
uma empresa grande.
SP:
E o moleque Marinho? A bola esteve presente sempre nas brincadeiras?
MR:
Na época de gurizinho jogava com bola de meia. Pegava uma meia velha, enchia de
papel, pano ou o que desse. E estava pronto para jogar.
SP:
E onde eram os palcos? na rua, na escola...?
MR:
Na época, tinha um timinho em cada rua, em cada duas ou três quadras até. Existiam
muitos campinhos, que a gente mesmo fazia.
SP:
E a escola? Onde você estudou e até que série?
MR:
Estudei aqui no Grupo Escolar Conselheiro Carrão, na Vila Sofia mesmo. Fiz até
a 7ª Série.
 |
O início da carreira |
SP:
Qual foi o primeiro time mais organizado, em que você atuou?
MR:
Meu primeiro time mesmo foi também aqui na Vila. O Vila Sofia era um time muito
bom. Muitos meninos de qualidade. Eu tinha uns 14 ou 15 anos.
SP:
Lembra de algum menino que se destacava?
MR: O
Carlinhos, meio campo. E o Ademir, lateral direito.
SP:
Quando menino quem eram os seus ídolos? E o seu time de coração?
MR: Eu
sempre fui santista. Meu falecido pai também era santista fanático. Tinha um rádio,
daqueles antigos, grandões. Ficávamos ligados no rádio ouvindo os jogos do
Santos. E eu só saia de casa para jogar bola depois que acabava o jogo do
Santos. Meu grande ídolo não poderia ser outro: Pelé.
SP:
Não ia aos estádios? Já se transmitiam jogos pela TV naquela época?
MR: Nesta
época (década de 60) era só rádio. Como diz o pessoal do interior: “assistia
pelo rádio”...
SP:
Mas e aqui de Curitiba, do estado do Paraná? Quem eram os “feras”, que você
admirava?
MR: Existiam
muitos bons jogadores, mas o meu ídolo era o Krügger (hoje, gerente das
categorias de base do Coritiba). Jogava no Britânia, na época. Mais tarde eu fui jogar nos juvenis do
Britânia, mais ou menos quando ele foi para o Coritiba. Era um “cracaço” de bola. Aí teve o problema
da joelhada na barriga que fez com que ele parasse de jogar. No Ferroviário, gostava do Paulo Vecchio. No
Atlético, sempre foi o Sicupira. Inclusive quando eu comecei no Colorado era o
seu Barcímio, pai do Sicupira, quem fazia os contratos dos jogadores. Pessoa
muito boa.
 |
Um dos times amadores na década de 60 |
SP:
Quando adolescente só jogava bola e estudava? Ou trabalhava também?
MR:
Eu trabalhava na Eletro Dínamo. E jogava no Vila Sofia. Depois é que fui pro
Britânia.
SP:
E como foi essa ida para o Britânia?
MR: Em
1967, eu jogava no antigo Primavera, que ficava aqui ao lado da Vila Sofia. Disputávamos
a Taça Tapajós, que existia na época. Em um jogo no campo do Bola de Ouro, no
Uberaba, o Sisíco (atual auxiliar técnico das categorias de base do Coritiba),
que cuidava dos juvenis do Britânia, foi
ver o jogo e me levou para lá. Joguei no Britânia até 1970, quando fui pro
exército.
SP:
Em 1970, você foi convocado para a Seleção Paranaense de Juvenis, para disputar
o Campeonato Brasileiro de Seleções. Como foi a experiência?
MR:
Eu ainda jogava no Britânia. Na época, em nível nacional para os juvenis, só
existia o Campeonato Brasileiro de Seleções. Naquela seleção tinha muita gente
boa. A base era do Coxa: Levir Culpi
(hoje técnico de futebol, no Japão) e Dirceuzinho (disputou três Copas do
Mundo), por exemplo. Do Ferroviário
tinha o Paulo Santos, lateral esquerdo, que jogava muito. Era um timaço.
Perdemos na semifinal para São Paulo, que sediou a competição.
SP:
Quem era a fera do time?
MR:
Para mim, o Dirceuzinho, do Coxa.
 |
Zito convidando Marinho para jogar no Santos |
SP:
Mas você se destacou muito nesta competição. Veio até um convite do poderoso
Santos, de Pelé, na época. Como foi isso?
MR: O
Zito (astro do Santos e da Seleção Brasileira na década de 60), que era o
diretor de futebol do Santos, na época, foi ver o jogo contra São Paulo. Joguei
bem esta partida e ele me convidou para ir para Santos, tirar os últimos seis
meses do exército em Santos, e jogar no clube. Era um sonho. Jogar no melhor
time do mundo, ao lado do ídolo Pelé.
SP:
E o que te fez não ir para lá?
MR:
Vieram os papéis, o pedido de transferência para o quartel. Na época o Coronel
Rossi, do quartel do Boqueirão liberou e tudo ficou acertado com o exército. O pessoal do Santos iria me buscar no
aeroporto em São Paulo. Eu cheguei em casa e falei com meus pais que iria
embora, para jogar no Santos. Mas meus pais não permitiram, não queriam que eu
saísse de Curitiba. E tive que obedecer.
SP:
Você deve ter ficado arrasado, frustrado?
MR: Resolvi
parar com tudo e trabalhar. Jogar bola dali para frente, só no amador. Nos
times aqui da Vila Sofia. E no quartel, onde já jogava.
SP:
No quartel? Existia um time no quartel?
MR:
Tinha sim. Servi o exército no quartel do Boqueirão, no 3º Exército. Fomos
campeões do sul, pelo 3º Exército. O campeonato envolvia os estados do sul,
Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Aí fui convocado para a Seleção do
Exército, que foi disputar em Belo Horizonte um torneio das Forças Armadas,
envolvendo Exército, Marinha e Aeronáutica. Eu era o único aqui do Paraná na
competição. Nossa, mas lá não deu nem graça, foi só goleada. O time do exército
era muito bom.
SP:
Mas e o Britânia?
MR:
Além da decepção de não ter ido para o Santos, na época (final do ano de 1970)
houve a fusão que fez nascer o Colorado (Ferroviário, Britânia e Palestra
Itália se fundiram). Mas não sei o que houve. Tinha um treinador que não queria
os meninos do Britânia. O time juvenil inteiro do Britânia foi para o Bamerindus,
trabalhar e jogar nos bancários. E largamos o futebol, digamos, “profissional”.
SP:
Banco Bamerindus? Quem é que organizava isso?
MR: O
Paulo Vecchio que comandava. Fomos até campeões brasileiros de bancários na
época. Só trabalhávamos e jogávamos, não treinávamos. O Paulo Vecchio era gente
boa, sempre tratou todos muito bem.
SP:
Uma curiosidade. A fusão entre Colorado e Pinheiros, que formou o Paraná Clube,
em 1989, foi meio traumática. Até hoje, mais de 20 anos passados, ainda existem
os que foram e ainda são contra a fusão. E a fusão entre Ferroviário, Britânia
e Palestra Itália, que originou o Colorado, em 1971, foi assim também? Houve
muita rejeição na época?
MR:
Não. Foi bem tranqüilo. O pessoal da
rede, que mandava no Ferroviário, os do Britânia e do Palestra, todos apoiaram
a fusão.
 |
O Colorado, onde tudo começou |
SP:
Como foi que aconteceu a sua volta ao futebol? Ao Colorado?
MR: Em
1974 o seu Geraldo Damasceno, o Geraldino, que me conhecia da época do Britânia
assumiu o Colorado e me convidou para fazer um treino lá. Ele ia todo dia no Bamerindus
falar comigo, para fazer um coletivo. E eu não aceitava. Um dia, eu disse: “faz um coletivo no sábado, que é minha folga
no banco, que eu vou”. Ele fez e eu fui
lá, num sábado, e treinei. Acabou o treino, peguei minhas coisas e fui embora. Quando
já estava lá na rua João Negrão, para pegar o ônibus de volta para casa, veio
um menino correndo me dizendo que o seu Hélio Alves (supervisor do Colorado, na
época) queria falar comigo. Voltei lá e quando cheguei, já tinha um contrato
pronto. Era só eu assinar.
SP:
E aí?
MR:
Aí “cresceu os olhos” (risos). Vamos dizer que eu ganhava mil cruzeiros no
banco, o contrato era de seis ou sete mil. Aí assinei (mais risos).
SP:
O início no Colorado foi tranquilo?
MR:
Foi sim. O meu primeiro jogo foi contra um time da Romênia, um amistoso. Entrei
de ponta esquerda. Depois a coisa foi acontecendo. O seu Geraldo sabia que eu jogava
no meio, e fui conquistando o meu espaço. Fomos fazer uma excursão na Europa e
as coisas foram se ajustando.
"Foi um dos melhores jogadores da sua posição, na época. Pelo
futebol e pela liderança que exercia. Mesmo sendo de estatura baixa e meio tímido,
quando entrava no gramado se transformava em um gigante. Era de poucas
palavras, mas quando dava uma “dura” dentro de campo ninguém retrucava, todos
obedeciam. Tinha um raciocínio muito rápido e um posicionamento diferenciado. E
ainda chegava de trás para fazer alguns golzinhos. Certamente se jogasse no
futebol de hoje seria um dos melhores meias do país." (Dionísio Filho - companheiro de Pinheiros, hoje comentarista esportivo)
SP:
Teve o apoio do Geraldino neste processo?
MR:
Sem dúvida. O Geraldino foi quem deu esta primeira chance. O Loyola, preparador
físico da época também ajudou bastante.
SP:
E entre os “boleiros”? Quem te estendeu aquela “mão amiga”, nessa hora difícil,
que é o começo?
MR: O
Zequinha, zagueiro (posteriormente técnico de futebol). Foi até meu padrinho de
casamento.
 |
Com a esposa Rose |
SP:
Falando em casamento, quando você casou?
MR: Casei
em 1978. Em 23/03/1978. Com a Rose (Roseli do Rocio Rocha).
SP:
Quantos filhos?
MR:
Duas
meninas. A Andréia, hoje com 30anos e a Juliana, com 25.
SP:
Já te deram netos?
MR: Sim.
A Andréia dois: o Caio (8) e a Gabriela (11). A Juliana nos deu a Ana Carolina
(4).
SP:
E o Caio é do ramo? Já joga uma bolinha?
MR: Já
sim. Joga em uma escolinha aqui na Vila. Vamos ver se dá prá coisa... (risos).
SP:
Voltando ao futebol. Essa primeira passagem pelo Colorado durou até quando?
MR: Até
1977, quando fui para o Operário, de Campo Grande/MS.
 |
O Operário/MS, 3o no Brasileirão de 1977 |
SP:
Nesse ano o Operário/MS fez uma campanha histórica no Brasileirão. O time era
bom mesmo?
MR: Time
muito bom, muito certinho. Só perdemos na semifinal, para o São Paulo, que
acabou campeão. Lembro o time inteiro: Manga; Paulinho, Biluca, Silveira e
Escurinho; Édson, Roberto César e Marinho; Tadeu, Everaldo e Peri.
SP:
Do Operário você foi para o Guarani/SP?
MR:
Não. Do Operário voltei para jogar o Estadual de 1978, pelo Colorado. Foi o ano
que perdemos a semifinal para o Atlético/PR, naquele desastre dos quatro gols
do Ziquita, nos últimos 15 minutos, quando vencíamos por 4x0, na Baixada. Depois
disso é que fui para o Guarani.
SP:
O Guarani/SP tinha vencido o Brasileirão de 1978 e jogaria a Libertadores em
79. Como foi a tua ida para lá?
MR: O
Carlos Alberto Silva me conhecia do Operário. Em 79 me levou para jogar a
Libertadores. Participei de quase todos os jogos. Joguei em quase todas as
posições, de volante até ponta esquerda.
SP:
Quem era “o cara” daquele Guarani/SP?
MR: O
Careca. Com 17 anos, era muito bom, um “cracaço”. E gente finíssima. Morávamos
no mesmo quarto, no Brinco de Ouro, enquanto eu não encontrava um apartamento,
para levar a minha família.
 |
Com Ari Marques, em treinamento |
SP:
Depois do Guarani/SP, novamente o Colorado, em 1980. Foi o ano do primeiro e
único título do clube. Meio-título, pois dividiu com o Cascavel, naquela
polêmica partida do cai-cai. Conte-nos um pouco desse ano, dessas passagens.
MR: Em
1980 voltei pro Colorado e foi o Estadual do meio título. Perdemos de 3x0 lá em
Cascavel, que era dirigido pelo Borba Filho. Precisávamos ganhar de quatro, em
casa. Aí teve o cai-cai. Mas merecíamos
o título. Aquele ano aconteceu de tudo: gol de goleiro do Cascavel, o Zico, no
Joel Mendes; caiu a trave em um jogo; cai-cai no jogo final.
SP:
Vocês esperavam que o Cascavel fosse fazer esse famoso cai-cai naquele dia?
MR: Não
esperávamos. Nos preparamos para ganhar de pelo menos quatro gols. E tenho
certeza de que iríamos fazer e ganhar o título.
SP:
Depois dessa decisão como foi a sua trajetória?
MR:
Em 1982 fui emprestado ao Botafogo de Ribeirão, com o Osmarzinho, do Coxa. O
Raí estava começando na época. O Sócrates estava no Corinthians e aparecia por
lá de vez em quando. Voltei para o Colorado para disputar o Paranaense de 1982,
e fomos vice, de novo. Perdemos o título para o Atlético/PR, naqueles 4x1 (jogo
final, no Couto Pereira). Em 1983 fui emprestado ao Vitória da Bahia. Chegando
lá, tínhamos que ganhar nove jogos seguidos para chegar ao BaVi final. E ganhamos.
Mas na final perdemos. Houve uns casos que nem gosto de comentar...
SP:
Depois disso, a volta ao Colorado e a ida para o Pinheiros?
MR: Em
1984, o Colorado montava um time com jogadores de renome, o Sele-Boca. Pelas
conversas com os dirigentes senti que não me queriam mais. O Zico (goleiro),
que era muito meu amigo, jogava no Pinheiros. Ele falou com o seu Érton (Coelho
de Queirós, presidente do Pinheiros, na época), que me chamou para conversar e
acertamos tudo.
 |
O Pinheiros, campeão em 1984 e 1987 |
SP:
O Pinheiros não tinha nenhum título nesta época. Em cinco anos, durante a sua
passagem pelo clube, foram dois títulos e três vices-campeonatos. Você
imaginava que poderia dar tão certo a tua ida para lá?
MR: O
grupo do Pinheiros era muito bom. Quando eu cheguei tinha uma base boa, experiente,
com o Toinho (goleiro), Dionísio (Filho, lateral esquerdo, atualmente comentarista
esportivo), o Camargo (atacante); e a gurizada que era muito boa. Eu sabia que
seria um time muito bom.
SP:
O que ficou dessa passagem pelo Pinheiros?
MR: Foi
um grupo excelente, desde a diretoria. Todos sempre me trataram bem. Só fiz amizades ali. Fui muito feliz nos cinco
anos que joguei no Pinheiros, de verdade. Foram dois títulos e três vices, e
meio “roubados” ainda (risos).
SP:
Após a passagem vitoriosa pelo Pinheiros você jogou no interior do estado. Como
foi?
MR: Em
1989 fui para o Matsubara. Eles vieram atrás de mim, me fizeram uma proposta
interessante e eu fui. O Sueo Matsubara era quem comandava o clube na época. Em
dois anos, fizemos duas boas campanhas, sempre entre os primeiros e eles revelaram
e venderam uns 12 jogadores, como Ratinho, Tico, Jorge Luis, Jorge Rauli, todos
para grandes clubes do Brasil e de fora. Acho que ajudei. Em 1991, eu tinha
decidido parar, mas o Poletto (zagueiro e amigo de Marinho até hoje) e o Zico
(goleiro) me chamaram, e eu fui para o Sport, de Campo Mourão. Fizemos um bom
time.
 |
Robérson (a esq.), um dos muitos que ajudou revelar |
SP:
Os times em que você jogou sempre revelaram muitos jogadores. Colorado,
Pinheiros, Matsubara. Você acredita ter contribuído para isso?
MR:
Creio que sim. Alguns meninos que jogaram comigo, como o Ratinho, o Rauly, sempre
me disseram que isso aconteceu mesmo. E eu tinha esta característica de dar
muita moral para a meninada, dar confiança. Sempre dizia: “vamos lá que você
vai ser grande”... incentivava, cobrava... Isso durante toda a minha carreira.
Foi de fato uma característica minha.
SP:
Pode citar alguns dos técnicos que mais te marcaram?
MR: O
Borba Filho, que foi meu técnico na seleção juvenil e no Pinheiros. O Geraldino,
que me deu a primeira oportunidade e me dava muita moral. O Castilho, no
Operário e o Carlos Alberto Silva, no Guarani.
SP:
Quais as diferenças que você enxerga nos atletas de antigamente e nos de hoje?
MR: A
diferença é que antigamente não se tinha preocupação com outras coisas que não
se jogar bola. Hoje se importam se o campo é ruim, se a chuteira é deste ou
daquele jeito ou cor. Antes se tinha mais orgulho de jogar. Hoje em dia é
diferente. Na minha época até descalço eu jogaria...
SP:
Vamos falar de uma coisa muito comum ao teu talento: de craques. Quem foram os
craques de antes da tua fase de atleta?
MR: Pelé
e Krugger.
Raríssima espécie de jogador de futebol. Imprescindível a
qualquer equipe, pois fazia de tudo um pouco e muito bem. Melhor ainda, fazia
seu time jogar nos momentos difíceis e importantes. Muito me orgulho de tê-lo
tido como companheiro de clube, como capitão e amigo. (Carlinhos Neves - Preparador Físico, atualmente servindo à Seleção Brasileira)
SP:
E os craques da tua fase de atleta?
MR: Independente
da nacionalidade, eu admirava muito o Platini. Por sua técnica, estilo e
elegância. No Brasil, depois do Pelé, o fera para mim foi o Zico. Joguei com o
Edu, irmão dele, que jogava muito também. E o Careca, do Guarani, muito bom.
 |
Treino no Pinheiros. O primeiro a direita é Carlinhos Neves, hoje preparador físico da Seleção Brasileira |
SP:
E os craques de hoje? Você acha que estão diferentes?
MR:
Tem alguns como os moleques do Santos (Neymar e Ganso), mas a maioria joga mais
na base da correria.
SP:
Amigos? Algum especial?
MR: Não
quero citar nomes, para não esquecer ninguém. O grupo do Pinheiros era muito
bom, mas onde passei só fiz amigos.
SP:
O que ficou de bom do futebol?
MR: Os
lugares onde estive e conheci. E as pessoas que conheci. O que ficou de legal
do futebol foi o conhecimento.
SP:
E de ruim?
MR:
Nada. Nem a concentração, que eu gostava. Dava para descansar bem, se
alimentar. E era só um dia. Não se ficava preso, como alguns imaginam.
SP:
O que mais te influenciou para se tornar um jogador de futebol?
MR: Meus
irmãos jogavam e sempre me levavam junto, para assistir, desde piá. O falecido
Luis da Rocha, o Cascudo, (irmão mais velho), muito conhecido no bairro, me levava nos jogos do Esperança, ou onde ele
jogasse. O outro, um pouco mais novo que o Luis, foi um dos melhores
controavantes que teve por aí, o Zezo.
SP:
Como era o jogador Marinho na visão do Sr. Mario da Rocha hoje?
MR: Não
sei bem o que responder. Eu armava e desarmava, gostava de jogar. Errava poucos
passes. Um defeito talvez foi não ser finalizador. Eu fazia os artilheiros que
jogavam ao meu lado, mas não fazia muitos gols.
Foi o melhor jogador com quem eu tive a "honra de
jogar". Aprendi muito com ele. Como me colocar em campo, como reagir a
certas situações dentro de um jogo; a ser sério quando se devia agir assim,
concentrado quando necessário, e brincalhão quando o ambiente possibilitava. O
mais impressionante era ver como que ele, com tão pouca estatura, podia ser tão
respeitado. Sua voz era uma ordem dentro de campo. Sem expor a ninguém, comandava
a equipe.
Como jogador era um craque. Visão de jogo, posicionamento,
um passe incrível, protegia a bola como ninguém, fazia o time jogar. Aos 32
anos mostrava uma condição física invejável. Hoje só poderia dizer, meu muito obrigado MARINHO, o que eu fui ou
fiz dentro do futebol, com certeza em grande parte foi inspirado no “DA ROCHA”.
Ele foi e sempre será meu ÍDOLO máximo no futebol. (Marquinhos Benatto - companheiro de Pinheiros, atualmente técnico de futebol no México)
SP:
Uma das tuas características principais era a facilidade com que se desmarcava.
Mesmo sendo sempre muito marcado pelos adversários, você sempre conseguia estar
livre. Concorda com isso? Qual a receita?
MR:
Concordo. Era uma das minhas preocupações em campo. Mas vejo como intuição do
jogo. Eu gostava que me dessem a bola, sempre. Então procurava estar livre para
receber os passes.
SP:
Você sofreu com os problemas nos olhos, de visão. Quando percebeu o problema?
MR: Começaram
em 2001. Apareceu do nada. De repente, foi de tanto choque durante o tempo em
que joguei, sei lá. Quando percebi já era muito tarde. Foi preciso fazer o
transplante das duas córneas. Primeiro fiz a do olho direito em 2003. Depois o
esquerdo em 2004. Hoje recuperei 50% dos da visão nos dois olhos. Fiquei mais de um ano completamente cego,
antes da primeira cirurgia. Não desejo isso nem para o pior inimigo. É um
sufoco. Dá vontade de que o “Homem” chame logo, pois ficar sem enxergar nada é
muito complicado.
SP:
Voltando ao futebol. O que mais te encantava no futebol, que você copiou para o
teu estilo?
MR: Era
técnica, a beleza do jogo. Fui
aprendendo. No começo eu era meio mais
avançado, jogava como meia mais ofensivo. Depois me adaptei, um pouco mais
recuado.
SP:
Hoje é diferente? O futebol mudou?
MR: Antes
era mais amor à camisa. Hoje só se vê o dinheiro. Empresários enriquecendo...
SP:
Alguma coisa no futebol que você não tenha feito faltou alguma coisa?
MR: Jogando
eu fiz muitas coisas, ajudei muita gente. Criei filhos e netos. Em todo lugar
que chego sou sempre bem recebido. Acho que não faltou nada a fazer.
SP:
O que o Mario da Rocha, do alto de sua vasta experiência de jogador de futebol
diria a um menino que está começando?
MR: Tudo
se resume a uma palavra: Humildade. Não querer dar uma de “bom”, que só você
sabe das coisas. Tem que ser simples e humilde. Estudar, treinar muito e jogar.
E dar o máximo de si, sempre, em todos os dias, treinando ou jogando.
SP:
Marinho, deixe-nos uma mensagem final.
MR: Só
quero deixar um abraço para todos os amigos. De todas as áreas: jogadores,
técnicos, torcedores, profissionais das rádios, jornais e televisões. Onde sempre
fiz muitos amigos, mas muitos mesmos. Que sejam todos muito felizes.