segunda-feira, 14 de março de 2011

O FUTEBOL MODERNO E A TÁTICA DE JOGO


O FUTEBOL MODERNO E A TÁTICA DE JOGO

Depois da brilhante vitória do Coritiba, no Paratiba de ontem, por 4x2, estabeleceu-se uma polêmica a respeito da escalação do Paraná Clube. O treinador Ricardo Pinto vinha iniciando os jogos com três atacantes. Para a partida contra o Coxa, no Couto Pereira, optou per entrar com somente dois atacantes, colocando mais um volante, reforçando assim a marcação no meio campo. Para alguns, esta ação tornou a equipe retrancada. Para outros a atitude foi medrosa, covarde. Respeito a opinião de todos e colocarei a minha posição, não na expectativa de ser o “dono da verdade”, mas de poder auxiliar na reflexão sobre o assunto.
Inicialmente, não vejo como definir uma equipe que entra com dois atacantes velozes (Kelvin e Diego), um meia de criatividade (Kerlon) e dois laterais ofensivos (Paulo Henrique e Henrique) como retrancada ou medrosa. O fato de se optar por não iniciar com três atacantes deve-se mais a percepção do treinador Ricardo Pinto (e todos os que tenham um mínimo de coerência e conhecimento sobre futebol) de que a equipe atual do Coritiba é mais forte, individual e taticamente, que a equipe do Paraná Clube. Não defino a escolha como medrosa, e sim como opção tática, ao meu ver, perfeitamente coerente.
No Brasil, país onde todos os torcedores são um pouco “treinadores”, existe uma visão equivocada, na questão tática. O técnico de futebol que buscar alternativas táticas durante as competições é taxado de louco, inconsequente ou inexperiente, se a opção for pela ofensividade e de retranqueiro, covarde ou medroso, se a opção for por se fortalecer a marcação. Porém, somente quando as alternativas resultam em insucessos, pois, em caso de vitória, será considerado “gênio”, mesmo que entre em campo com 10 zagueiros ou 10 atacantes.
Eu enxergo, na ação de Ricardo Pinto, tanta clareza e coerência, que chega a me surpreender opiniões contrárias, não de torcedores, passionais por essência, mas de profissionais da área do futebol. Se todos concordam que o time do Coritiba é muito forte, o mais forte atualmente, e de que no meio campo alviverde está a sua maior força, por que não se preocupar em marcar melhor este setor? Principalmente se, como foi o caso do Paraná de ontem, pode-se usar (hipoteticamente) a velocidade de Kelvin e Diego, para os contra-ataques em cima dos zagueiros do Coxa, bem menos velozes que os dois. Contando ainda com a ofensividade do meia Kerlon e o apoio qualificado dos laterias tricolores. Somente porque o Paraná venceu as quatro últimas partidas, terá o treinador a obrigatoriedade de escalar a mesma equipe, independente de se analisar a produção dos setores, nestas partidas, ou da qualidade do adversário seguinte? Creio que não.
Analisando a produção do tricolor, na última partida fora de casa, (vitória por 1x0,contra o Corinthians Paranaense), nota-se que o resultado foi conquistado também pelo esforço e qualidade do Paraná (que iniciou com três atacantes), mas muito mais pelo fato de o Corinthians ter dois atletas expulsos. No primeiro tempo, com igualdade numérica, o “timãozinho” foi superior, dominou o despovoado meio campo tricolor, e só não terminou a etapa na frente porque o goleiro Thiago Rodrigues operou alguns milagres. Veio a segunda etapa, o gol do Paraná e as duas expulsões. Aí o jogo se definiu. Portanto, ficou evidente a dificuldade do tricolor em marcar o meio campo corintiano, com a formação de três atacantes. Isto, por si, já explicaria a opção de Ricardo Pinto em se reforçar no setor para enfrentar o meio campo coxa-branca, bem mais forte que o do Corinthians.
Para ilustrar a minha posição de que as variantes táticas são importantes e que se pode, e deve, definir a equipe também pelas características dos adversários, recorro à melhor equipe de futebol do mundo, na atualidade: o Barcelona. A equipe espanhola, mesmo contando com os três melhores atletas da atualidade - Messi, Xavi e Iniesta – alterna suas escalações iniciais, ora entrando com o defensivo volante argentino Mascherano, ora entrando com mais um atacante. Na partida da última terça-feira, quando só a vitória contra o Arsenal, de Londres, classificaria o Barça, o técnico Pepe Guardiola optou por entrar com  Mascherano, como volante, e não com Xavi mais recuado e mais um atacante. Evidentemente pela preocupação em marcar o excepcional meia Fábregas, do Arsenal. E ninguém o chamou de retranqueiro ou covarde. Venceu e classificou o Barcelona para a fase seguinte. Talvez, se tivesse sido mais “corajoso”, quem poderia estar comemorando a classificação seria a equipe inglesa. Ou não, ninguém pode afirmar.
Relembro o exemplo que vivi, como atleta, na badalada equipe do Coritiba, de 1989. Equipe técnica, que marcou época por apresentar um meio campo muito criativo e habilidoso, composto por Osvaldo e eu, mais recuados, e Carlos Alberto Dias e Tostão, mais à frente. Esta formação atuou quase que a competição inteira. Ao chegaremos nas semifinais, contra o Atlético/PR, o nosso técnico, Edu Coimbra, alterou a tática da equipe, sacando o japonês Kazu, atacante agudo, que atuava pela ponta-esquerda, e colocando o Marildo, volante de forte marcação, para jogar ao lado de Osvaldo, fazendo com que eu, Carlos Alberto Dias e Tostão atuássemos mais a frente, com apenas Chicão, como atacante de origem. Resultado: um passeio no rubro-negro, nas partidas semifinais e a conquista posterior do título. Não me recordo de ninguém chamando o Eduzinho de medroso, covarde ou retranqueiro.
Portanto, o que se busca, em uma equipe de futebol, é o equilíbrio. E este não tem nada a ver com a quantidade de zagueiros, volantes ou atacantes. Está na sintonia entre os atletas. Por vezes, isto ocorre com perfeição, como é o caso da equipe atual do Coritiba. Outras vezes, e na maioria delas, necessita-se de mais tempo e muito trabalho. No futebol moderno não existe mais espaço para o antiquado pensamento de que não se pode, ou deve, buscar alternativas táticas, de acordo com os adversários. Este é um pensamento arcaico, dos tempos em que o Brasil se via soberano, e se achava “o melhor” e sem adversários. Hoje tudo mudou. E temos que mudar este pensamento – imprensa, torcedores, atletas e profissionais da bola – se não quisermos, em breve, vermos o nosso futebol se tornar coadjuvante, no cenário internacional.

4 comentários:

  1. Concordo plenamente com sua opinião.
    Muitas vezes os treinadores estudam as características adversárias e modificam suas equipes baseados nesses estudos. Algumas vezes não dá certo por causas extraordinárias, como por exemplo a lesão muscular do Kerlon ou expulsões. Como um time é um quebra-cabeça, a alteração de uma peça nesse esquema pode fazer ruir tudo o que se tinha pensado antes pois nem sempre se tem substitutos à altura. Abraço e parabéns pela abordagem.

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  2. Olha padrinho, eu tenho assistido pouco o Campeonato Paranaense, porém nem é preciso vê-lo para saber quem é o melhor.
    Portanto, nada mais justo do que tentar segurar um pouco esse time, que é o Coritiba.
    Agora sobre as mudanças táticas, acho fundamental que um time possa ter variações, a exemplo o Barcelona, merecedor do tão badalado momento que vive. Contra o Arsenal, entrou em campo, apesar do mesmo esquema tático no papel, totalmente diferente do que é comum (Valdes, Dani, Piqué e Puyol, Abidal, Busquets (Mascherano), Xavi e Iniesta, Messi, Villa e Pedro), a ousadia do Guardiola impressionou, pelo menos a mim, colocando na zaga (óbvio que tinham desfalques) o Busquets, que é volante, e Abidal, que joga como lateral no Barcelona, mesmo tendo no banco Milito, um zagueiro. Achei fantástico. Até porque, ao meu ver, Abidal é um bom marcador, porém na saída peca pela falta de qualidade.
    Então, creio que seja importante haver variações.
    Lógico que cada caso é um caso, mas entrar em campo contra o Coritiba, na fase que está, no Couto Pereira, comparando as equipes, com 3 atacantes, é um certo suicídio. Achei justificável a mudança.
    Parar de fazer sempre a mesma coisa, é interessantíssimo e necessário, não só no futebol.

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  3. O problema foi que o Kerlon foi escalado como atacante, o que ficou claro nas entrevistas do Ricardo Pinto, quando afirmou que quem faria as vezes de meio campo seria o Camargo, que, apesar do gol, errou passes facilimos e foi inerte na marcação.
    A formação tricolor foi um 4-3-0-3, assim o Leo Gago, por exemplo, tinha todo o espaço do mundo para começar as jogadas e não tinha nenhuma preocupação em marcar, uma vez que a ligação entre a defesa e o ataque tricolor inexistia.
    Tivesse o Paraná Clube atuado com um centroavante, os meninos Kelvin e Diego poderiam buscar mais jogo atrás, dando mais trabalho aos volantes alviverde.
    Outra opção tática seria sacar Kelvin, Kerlon ou Diego em troca de um zagueiro, liberando os alas, assim a opção poderia ser por um 3-6-1 com 2 meias ou 3 volantes.
    É impossível afirmar que com isso o Paraná venceria, e particularmente eu acredito que não, porém certamente este jogo, que prometia ser um dos mais interessantes do campeonato, teria sido um espetáculo melhor.

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  4. Muito bom o seu comentário. A única ressalva que faço é que o Barcelona entrou com o Mascherano porque estava sem os zagueiros titulares. Então o volante Busquets, teve que jogar improvisado na zaga, ao lado e Abidal. Mascherano entrou no lugar do Busquets no meio, naturalmente.

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