quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Papo Cabeça


Alex: esse é 10!  -  Parte I

O "piá" paranaense que com seu talento e genialidade conquistou os estádios do mundo

O menino Alexsandro de Souza nasceu em Curitiba, em 1977. Mas foi pelas ruas e “campinhos” do Jardim Campo Alto, bairro do município de Colombo, região metropolitana de Curitiba, que cresceu e se formou um dos maiores craques que o futebol paranaense e brasileiro já viram. Todo o talento incomparável e a precisão milimétrica na perna esquerda começaram a brotar naqueles "campinhos" do bairro.
Vindo de uma família simples e apaixonada por futebol, onde até a mãe era “fera” nos campos, foi em seu pai que encontrou o grande apoio e incentivo para seguir adiante, sendo sempre sério e responsável. Primeiro as quadras de futsal, defendendo a AABB; depois, as categorias de base do Coritiba FootBall Club, porém sem deixar de brilhar na bola pesada (jogou pela AABB até já ser profissional do Coxa), viram nascer um extraclasse.
Garoto ainda, com 18 anos apenas, já vestia a camisa 10 do Coritiba e conquistava a torcida e os primeiros títulos.  Em dois anos, já como atleta das seleções brasileiras de base, despertou o interesse do poderoso Palmeiras, de Felipão, Rivaldo e Djalminha, entre outros. Desembarcou no Parque Antártica e de lá ganharia o mundo. Era o palco perfeito para desfilar a arte que possui. Retribuiu ao “Palestra” com vitórias e títulos (a Copa Mercosul e a sonhada Libertadores da América são os mais importantes). Deixou como obra prima da passagem pelo clube um gol antológico, onde “chapelou” dois defensores são-paulinos e, em pleno Morumbi, aplicou também um “chapéu” em Rogério Ceni, antes de empurrar a bola com um toque sutil, da encantada perna esquerda, para o fundo da rede. Um dos mais belos gols da história do Morumbi.
Passagens frustradas pelo Parma da Itália e pelo Flamengo contrastam com os títulos, como capitão inclusive, na Seleção Brasileira Pré-Olímpica, em Londrina, e na Seleção Principal, da Copa América, no Peru, em 2004. Entre esses dois feitos, o fracasso nas Olimpíadas de Sidney, em 2000, sob o comando do amigo Wanderley Luxemburgo. E mais do que tudo, os anos dourados no Cruzeiro, onde foi o maestro da equipe que conquistaria a Tríplice Coroa, em 2003 (Campeonato Mineiro e Brasileiro e Copa do Brasil).
Em 2005 retornaria à Europa, mais precisamente ao Fenerbache, da Turquia, onde está até hoje (tem contrato até 2013), sendo o grande ídolo da equipe. No futebol turco já foram mais de 10 títulos conquistados, inclusive o de artilheiro do campeonato turco de 2007, mesmo sendo um meia armador.
Até a última temporada, foram 846 jogos, 363 gols e 264 assistências, com 68 jogos pela Seleção Brasileira, Olímpica e Principal. Uma carreira fantástica. Faltou algo? Uma Copa do Mundo talvez. Mas isso e muito mais, quem nos contará é Alex de Souza, ou para nós brasileiros, simplesmente Alex.

Serginho Prestes (SP): E o início de tudo... Onde e quando você nasceu? E onde cresceu?
Alex: Nasci no dia 14 de setembro de 1977, na maternidade Santa Brígida, em Curitiba e cresci numa vila chamada Jardim Campo Alto, próximo à Capela do Atuba, no município de Colombo. Só saí da vila aos 19 anos, quando fui negociado com o Palmeiras.
A família Souza reunida
SP: A bola já fazia parte do “mundinho” do menino Alex antes da idade escolar? E a sua família, alguém era do ramo?
Alex: Meu pai era jogador de futebol amador. Desde que nasci andava em cima de caminhões, atrás dele, para vê-lo jogar. Minha mãe participava de uma equipe feminina de futebol e eu também vivia assistindo aos jogos dela. A bola sempre esteve presente. Antes dos sete anos estava sempre com uma bola no pé.
SP: Mas existiam outras brincadeiras preferidas? Quem eram os “chegados” desta fase? Irmãos? Primos? Amigos da rua?
Alex: Bola de gude, carrinho de rolimã... Mas a brincadeira preferida mesmo era correr atrás de uma bola. Sempre estava com o meu irmão e com meus vizinhos. Numa vila como a minha, todos se conheciam.

Colégio Lacerda Braga, em Colombo
 SP: E a fase escolar? O menino Alex era também um bom aluno ou só queria jogar bola lá também?
Alex: Adorava a escola. Fui bom aluno sim. Na escola não tinha quadra, nem espaço para jogar futebol. Mas como sempre estudei na parte da manhã sobrava a tarde inteira para o futebol.
SP: Lembra de algum outro menino, amigo da escola que fosse “ferinha” na bola?
Alex: Na 5ª série mudei de escola e lá existia uma quadra poliesportiva onde jogávamos direto. Tinha um menino que jogava muito bem, inclusive tentei carregá-lo comigo para o Coxa, mas a família dele não deixou. Não sei que fim levou.
SP: Quem foi o “cara” no início da sua trajetória? Aquele que te apoiou e incentivou a efetivamente começar a jogar futebol?
Alex: Com certeza meu pai! Eu acredito que tenha tido o melhor pai do mundo, para um futuro jogador de futebol. Nunca me elogiou; nunca me criticou. Só falava para eu olhar, aprender com os bons exemplos e trabalhar de forma digna. Mas quando estava desanimado por algum motivo, ele sempre estava lá, para lembrar de algo positivo e me levar adiante. Minha mãe também me ajudou bastante nesse sentido, mas sempre foi um pouco mais crítica que meu pai.
SP: Quem era o seu ídolo nessa fase? Via muitos jogos na TV ou nos estádios ou ouvia pelo rádio?
Alex: O Zico. Cresci vendo o “Galinho”... Um pouco depois, comecei a acompanhar os times daqui e  queria ser o Tostão (ídolo do Coritiba, de 1989). Lembro que uma vez, quando eu jogava no infantil, o Tostão foi buscar o filho dele que treinava com a gente. Eu tremia só por vê-lo próximo a nós. Nessa fase eu ia pouco ao estádio. Comecei a ir mais ao Couto Pereira (estádio do Coritiba) a partir do timaço de 1989. Mas eu tinha meu radinho e ouvia sempre o Lombardi Jr (locutor de rádio, já falecido), Oldemar Kramer no plantão, as entradas do Kleina (Carlos Kleina, na época plantão da Rádio Clube, ao lado de Kramer e Lombardi Jr)... Sou apaixonado pelo rádio.
" No dia em que o levei na AABB pela primeira vez, ele destruiu no treinamento. Todos ficaram encantados. Era uma criança sensacional, um exemplo de vida. Sempre educado e obediente. Tecnicamente fantástico! "                                         (Prof. Miro - categoria de base do Coxa)
SP: Como e quando foi a sua ida para o Coritiba?
Alex: Fui numa peneira do Coxa em 1987, convidado por um amigo do bairro que jogava lá, o Sílvio. O Prof. Miro (treinador dos infantis do Coritiba, na época, e até hoje trabalhando nas categorias de base do clube) separava aleatoriamente os meninos e nós jogávamos no máximo 15 minutos. Nessa época eu tinha nove anos. Fui aprovado, mas o Prof. Miro me chamou de lado e disse que eu era muito novo, que não tinha nenhuma categoria de futebol de campo nessa idade e que me levaria primeiro para o futsal, para eu aprimorar vários fatores do jogo. Ele foi até a minha casa e falou com o meu pai, que permitiu. Só saí da AABB quando me tornei titular do time profissional do Coxa.
SP: Você sempre destaca essa sua ida para a AABB (Associação Atlética Banco do Brasil). Sente que esta passagem pelo Futsal teve importância na sua formação como atleta de alto rendimento?
Alex: A importância da AABB foi enorme, vital.  Ela me deu todas as oportunidades que um menino, passando de criança à adolescência precisa. Em relação ao futebol, a questão principal é a técnica desenvolvida no futsal, que trago comigo ate hoje.
SP: O que, de fato, o Futsal te acrescentou como jogador?
Alex: Acrescentou muito. Meu jogo sempre foi em cima de um curto espaço e da qualidade técnica. Nisso o futsal me ajudou muito.
Equipe Infantil da AABB, de 1991
SP: Algum grande ídolo no Futsal? Alguém que tenha te inspirado?
Alex: Eu adorava ver o Morruga e o Choco jogarem, mas quem eu mais gostava era o Vander. Tinha uma canhota espetacular.
SP: Certamente foram muitas conquistas, nessa passagem pelo Futsal da AABB. Pode destacar algumas?
Alex: Ganhei competições nas categorias mirim, infantil e infanto. Só não fui campeão metropolitano. Mas ganhamos a Taça Curitiba e a Taça Paraná. Mas o que mais marcou foi o título de Campeão Brasileiro Infantil, em 1991. Fizemos uma preparação muito legal e foi o melhor time de futsal que joguei.
SP: Algum companheiro do Futsal que brilhou no campo também? Algum que você destaque e que não tenha evoluído?
Alex: Joguei com o Ricardinho, Tcheco, Lúcio Flávio, Zé Elias, Lepatin. Dessa época, quem eu acreditava que seria profissional era o Castorzinho e o Vinícius Xavier. Tinham muita qualidade, mas não seguiram. E tiveram outros com menos destaque, e alguns que seguiram no futsal mesmo.
SP: Certamente existiram muitas pessoas da AABB que tenham te apoiado nos anos todos de clube. Alguém em especial? O que te marcou mais nesse período?

Alex: Citar somente alguns nomes seria até injusto, por que realmente fui muitíssimo ajudado por várias pessoas, na AABB. Só cheguei a ser profissional devido ao apoio da AABB, já que meus pais não teriam condições financeiras de me manter treinando no Coritiba, e o Coxa, na época, não nos ajudava financeiramente com nada. Além disso, pude até ajudar meus pais, logo cedo, com o pouco dinheiro que ganhava no Futsal. Isso marcou muito a minha vida.

Ainda menino, na base do Coxa
SP: De um momento em diante você jogou simultaneamente futsal na AABB e futebol de campo nas categorias de base do Coritiba? Qual a importância dessa fase na sua formação? Os técnicos desse período inseriram coisas no seu estilo de ver e jogar futebol?
Alex: A importância da base foi total. É aí que você aprimora tudo o que é natural, que já nasce com a pessoa. E ainda aprende situações novas, como tática e desenvolvimento do jogo.  Aprende a competir e a dar valor a todas as situações inerentes ao futebol. Eu fui treinado pelo Prof. Miro, no mirim em 1990; pelo Prof. Lima no infantil, em 1991 e 92; pelo Sisíco, no juvenil, em 1993 e 94; e pelo Nascimento,  nos juniores, em 1994. Todos ajudaram muito nas situações que citei anteriormente, mas ter trabalhado com o Sisíco me ajudou muito a ver o futebol da maneira como vejo hoje. Ele me ensinou que o mais importante no futebol é jogar de forma simples.
SP: Quando percebeu que poderia chegar ao profissional?
Alex: Em 1994 fui artilheiro do campeonato de juniores, mesmo tendo ainda idade de juvenil.  Jogava aos sábados à tarde nos juniores e no domingo pela manhã, nos juvenis. Em 1995 vários jogadores dos juniores subiram para o time principal. Nesse momento percebi que poderia ser profissional. Depois disso, treinava com o time principal e jogava nos juniores e aspirantes. Até o momento que surgiu a chance de jogar no time principal.
O início, no profissional do Coritiba
SP: Como foram os primeiros treinos? Qual a sensação de chegar ao profissional?
Alex: Tudo era diferente. O que facilitava para mim é que muitos atletas tinham subido da base juntos e nos conhecíamos há muito tempo. Mas os treinos eram diferentes, a cobrança era maior, e a qualidade melhor. Foi necessário um período para se adaptar.
SP: Conte-nos alguma passagem desses momentos de transição, desses primeiros dias no profissional.
Alex:  Num belo dia  fui treinar com o time principal e o Norberto (volante que jogou também no Internacional, de Porto Alegre) me deu uma “pedalada”, que me deixou torto. Ele virou e disse: “Você é novo, vai aprender”.  Anos mais tarde, jogando contra ele, em outro clube, dei uma “caneta” nele e falei: “Viu como aprendi...”(risos).
SP: Na base, quem eram os amigos do peito? E quem eram os que você admirava e acreditava que iriam brilhar no profissional?
Alex: Gegê, nosso goleiro, que hoje é preparador de goleiros;  Buiú,  um lateral esquerdo; Paulinho Tavares,  que fazia dupla comigo, eu na meia e ele de centroavante, e ainda jogávamos futsal juntos na AABB. Achei que ele chegaria, mas não aconteceu. O Dirceu era o craque da base, naquela época. Chegou ao time principal no mesmo ano que eu, mas não foi tão em frente. O Castorzinho, achei que seria o “10” do Coxa quando quisesse, mas não foi. E tinha um menino, chamado Índio, que jogava demais, e infelizmente não chegou ao profissional.
Comemorando um gol junto à galera alviverde
SP: Como e quando foi o momento da subida definitiva ao profissional?
Alex: Estava jogando muito bem nos aspirantes e tinha feito um campeonato de juniores fantástico, no ano anterior. O time principal não passava por um bom momento. Isso tudo ajudou para que eu começasse a treinar com os profissionais. E aí o Carpeggiani (técnico) me colocou para jogar.
SP: E o trabalho com o Carpeggiani?
Alex: O trabalho dele era bom. Era um treinador que queria montar um bom time. Exigia algumas situações de mim, mas principalmente me dava muita confiança para jogar.
SP: Quais as maiores dificuldades e diferenças que você encontrou?
Alex: Na verdade, a maior dificuldade era ir treinar todos os dias. Quando tinha treino nos dois períodos piorava muito, por que o Coritiba não tinha estrutura para manter seus jogadores no clube, no horário de almoço. Para mim, voltar até a minha casa, na hora do almoço é que era impossível.
SP: Qual ou quais foram as pessoas que mais te ajudaram a superar essa dificuldade inicial? Teve alguém?
Alex: Ademir Alcântara, Dida, Pachequinho, Jétson e Marquinhos Ferreira. Esses caras me ajudaram muito no primeiro ano.
SP: Rapidamente você conquistou o teu espaço e o respeito do técnico, da torcida e dos companheiros. O que foi decisivo para esta adaptação rápida no profissional?
Alex: A ajuda desses jogadores foi fundamental. Mas a moral que o Carpeggiani me deu foi algo absurdo.

No AtleTiba, maior clássico do futebol paranaense
 SP: E como foi a relação com a torcida?
Alex: Sempre boa, mas difícil. Quem jogou no Coritiba sabe como é duro jogar ali. E eu, por ser “prata da casa”, tinha uma cobrança um pouco diferente. Mas suportei bem isso e desenvolvi bem o meu jogo.
SP: Que fato mais te marcou na passagem pelo Coritiba?
Alex:  O fato marcante foi fazer parte de uma equipe que colocou o Coxa de novo na primeira divisão, em 1995. Sem estrutura nenhuma, nós conseguimos chegar. Sem salários, sem condições de treinamento. E por ter sido meu primeiro ano como profissional me marcou demais.

Ficamos por aqui, nesta primeira parte. Amanhã continuaremos daqui a trajetória deste menino-craque do futebol mundial. Os clubes brasileiros em que Alex brilhou. As Seleções Brasileiras. O futebol em clubes da Europa. Olimpíadas. E muito mais. Não perca!!!
Colaboração: jornalista Andréa Pereira

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