quarta-feira, 3 de novembro de 2010

SALVEM O CAMISA 10




O atual Campeonato Brasileiro nos mostra uma dura realidade: “Onde foram parar os meias brasileiros, ofensivos e criativos, que sempre caracterizaram o nosso futebol?”. Pelo que vemos, hoje, nos gramados do Brasileirão, estão na Argentina, Chile, mas não mais aqui. O sumiço de atletas de alto nível, nesta posição, foi –tristemente, para nós brasileiros- decisivo na última Copa do Mundo. Enquanto dependíamos de um combalido Kaká (único meia convocado por Dunga), Xavi e Iniesta regiam a Espanha, Messi a Argentina, Snejder a Holanda, somente citando alguns. Pior ainda que nem os ausentes (muito lamentados pela opinião pública brasileira) Ronaldinho e Ganso, provavelmente mudariam a história. Ronaldinho, em evidente declínio físico e técnico, já há muito não decide os grandes jogos para seu clube atual, o italiano Milan. Ganso, pela pouca idade e nenhuma experiência anterior na Seleção principal, não teria a segurança necessária para o protagonismo que a posição impõe, especialmente em uma Copa do Mundo.
Os mais otimistas podem dizer que, além de Paulo Henrique Ganso, do Santos – este sim, um digno representante da imortalizada camisa 10 – temos ainda Felipe Coutinho, formado no Vasco, hoje começando a brilhar na Inter de Milão. Pode ser verdade, mas é muito pouco para um país como o Brasil, que vive e respira o esporte, e se diz detentor do melhor futebol do mundo. Tempos atrás, cada grande time brasileiro tinha um meia ofensivo de excelência (quando não mais de um) em seu plantel, e outros tantos surgiam nas equipes menores deste nosso imenso país, aguardando sua chance nas equipes de ponta. A Seleção Brasileira, penta-campeã mundial, mostrava ao mundo o que de melhor havia nesta posição: Pelé, Zico, Rivelino, Rivaldo, entre outros. Ainda podemos falar em Ademir da Guia e Dirceu Lopes, que nunca puderam brilhar com a camisa da Seleção como brilharam pelo Palmeiras e Cruzeiro, respectivamente, devido à grande concorrência pela posição naqueles dias.  
Existe explicação para tal? Tentarei colocar minha posição, baseado em minha experiência na prospecção e desenvolvimento de jovens talentos. Ao finalizar minha carreira de atleta em 1997, optei por trabalhar com garotos, inicialmente em escolinhas de futebol, em Curitiba. Mais adiante (a partir de 1999), passei a trabalhar com atletas buscando o alto rendimento, como coordenador de categorias de base (Paraná Clube, Cianorte e Avaí) e técnico dos juvenis e juniores do Coritiba. Ainda trabalhei como observador técnico e agente de atletas, especialmente jovens. Infelizmente, pela falta de planejamento da maioria dos grandes clubes do futebol brasileiro, a condução da transformação de meninos em atletas é mal executada. No momento em que o garoto deveria estar sendo incentivado a desenvolver suas aptidões e habilidades, é colocada sobre ele a carga do resultado, a ênfase na vitória e não na evolução. Técnicos inaptos, que se preocupam mais em garantir seus cargos e salários, e não lapidar as jóias que tem em mãos são cobrados por dirigentes que em grande parte não são “do ramo”. Técnico bom é técnico campeão. Aí ocorre o fenômeno da extinção da espécie “meias ofensivos habilidosos”. Para jogar nas meias, os técnicos de resultado optam por adiantar jogadores que tenham poder de marcação, mais força e consciência tática, e que seriam, por suas características, meias armadores ou volantes. Já os garotos que tem mais habilidade são adiantados para jogar no ataque, pois terão mais condições de marcar os gols que garantirão o emprego do técnico e a glória do dirigente.
Outro fator que explica o sumiço dos meias ofensivos é a rápida transformação do futebol, nos últimos 20 anos. O esporte transformou-se em negócio. Negócio de milhões. Quase sempre gerenciado por agentes e empresários que vislumbram somente o lucro. Como expus anteriormente, é muito mais lucrativo transformar um menino habilidoso em um atacante goleador, que terá um valor de mercado muito maior, e trará maior lucro para os investidores e para o clube. Esses agentes, hoje popularmente conhecidos como “parceiros” ou “investidores” cumprem o seu papel. Certo ou errado buscam obter um bom resultado financeiro em suas operações. Quem não evoluiu nesta questão foram os clubes. Faz-se fundamental que os gestores do futebol destes clubes sejam preparados para enxergar à frente, com isenção, e busquem o equilíbrio entre saciar a sede de lucro dos que investem e exigem retorno, com a excelência técnica dos seus departamentos de formação. Caso contrário, o futebol brasileiro corre o risco de se transformar em uma “Serra Pelada”, onde os garimpeiros, ávidos pelas maiores e melhores pepitas, exaurirão a mina.
Os garotos brasileiros não perderam a sua qualidade. Perderam sim o espaço que antes existia em qualquer rua, de qualquer bairro, de qualquer cidade brasileira. Os “campinhos” onde surgiram os nossos grandes craques perderam a guerra para a especulação imobiliária. Porém, você ainda encontra (em maior quantidade nas pequenas cidades e comunidades carentes) meninos que demonstram a malícia do futebol brasileiro que encantou o mundo e nos transformou no país do futebol. Cabe aos clubes e seus departamentos de formação, receber esses meninos e transformá-los em craques. Respeitando suas características e focando sua evolução não somente nos princípios capitalistas, mas também nos conceitos do futebol. Na busca do resgate da essência do futebol brasileiro, teremos em médio prazo, atletas profissionais mais capacitados tecnicamente, o que por sua vez trará os lucros desejados e necessários, sem se correr o risco de estar matando o “estilo brasileiro de jogar futebol”.



2 comentários:

  1. Parabéns e sucesso no Blog!
    Excelente comentário!
    Abraços
    Mazur

    ResponderExcluir
  2. Parabéns pelo excelente comentário em seu novo blog. Plagiando seu raciocínio acerca das cifras que regem o futebol, penso que a partir do momento em que o lucro é priorizado em detrimento ao bom futebol, ou mesmo aos clubes o futebol perde seu brilho. Quantos craques foram renegados já nas categorias de base porque não havia interesse do empresário, ou até mesmo do clube em que este atleta aparecesse. São interesses alheios a bola que estão matando os nossos camisas 10.
    Grande abraço a todos

    ResponderExcluir